sexta-feira, 10 de junho de 2011

Diário de Bordo 06 de junho 2011 - Cachoeira do Jatobá

Cachoeira do Jatobá na época das chuvas

Acordamos bem cedinho para concluirmos nossa ida ao Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, nosso objetivo principal era vermos as condições atuais da cachoeira mais alta de Mato Grosso e assim fizemos.
Com o Divino completamente recuperado e tendo observado o volume de água dos rios do Parque, decidimos não acampar no topo da cachoeira, mas sim fazer um esforço maior subindo e voltando do Jatobá no mesmo dia.

Sinalização turística irregular no Parque Estadual

Saímos da Vila Bela e fomos seguindo até a entrada da Cascata dos namorados, a partir daí, apesar de conhecermos o caminho, deixamo-nos guiar por uma sinalização nova na Vila, alguém pintou algumas pedras de rio e na estrada, indicando a direção da Cachoeira do Jatobá, a primeira pedra pintada fica no meio do leito do rio da Cascata dos Namorados, depois cruzamos por outra "placa de pedra" ao longo da estrada de terra, passamos por um pequeno sítio na margem direita do Rio Jatobá e vimos que criaram um novo empreendimento turístico explorando o cânion do Jatobá e outras cinco cachoeiras, além de abrirem uma trilha nova no Parque e pintarem algumas pedras para indicar o caminho. As vezes pessoas bem intencionadas promovem mais danos que as pessoas que simplesmente ignoram o valor da natureza, mas nada disso é relevante depois de ver tantos milhares de hectares de Floresta derrubados dentro do Parque, café pequeno, diria meu avô.

Cachoeira dos Macacos na época das chuvas

Cachoeira dos Macacos durante nossa visita

Voltamos a fazer a trilha antiga que sobe a Serra e depois de alguma dificuldade chegamos a travessia do Córrego dos Macacos, acima de uma sequência de cachoeiras, a partir daí, encontramos a trilha que vem de dentro do cânion e do empreendimento citado a pouco e depois de cruzarmos mais duas "placas de pedra" entramos na trilha antiga de cima, que agora encontra-se bem aberta, ou porque está sendo muito utilizada ou porque tem havido um esforço concentrado em mantê-la limpa para facilitar a visitação.

Cânion e Cachoeira do Jatobá durante nossa visita

Seguimos em meio ao sol escaldante e muito seco e fomos até o Mirante da Cachoeira dos Macacos a cerca de 800 metros da Cachoeira do Jatobá, um fio de água despencava do paredão com cerca de 80 metros de queda livre, descansamos um pouco e continuamos até chegar ao cânion da Cachoeira mais alta de Mato Grosso, é emocionante estar neste lugar, muito visual, cores quentes e aquela coluna de água caindo e formando arco-íris e sons, mesmo com muito pouca água a cachoeira impressiona e impõe respeito, são pelo menos 250 metros de queda livre numa paisagem perfeita, contornamos o paredão, atravessamos o rio e procuramos um bom lugar para bivacar, recolher água e tomar um banho, depois é o de sempre, bater ponto com o GPS, produzir fotos, procurar sinais de fauna e algum vestígio arqueológico e recolher o lixo que dessa vez, pasmem, não encontramos.



Depois de tomar um lanche espartano, arrumamos os equipamentos e percorremos a mesma trilha no sentido inverso, no total, serão 10 km de caminhada e desta vez, leves e com a trilha fácil, duas horas e meia depois estávamos de volta ao carro e iniciamos o regresso a querida Vila Bela, esta noite iremos comemorar os quarenta anos do Ticó, um personagem emblemático de Vila Bela e por acaso, meu vizinho de casa na Rua Pouso Alegre, e a comemoração será no mais tradicional estilo Vilabelense, Peixes assados (Tambaqui, Dourado, Tucunaré), Caldo de Pintado, e Carne de gado assada, regada a muita cerveja e pagode ao vivo com o próprio pessoal da Vila.

Rio Jatobá acima da cachoeira, com pouca água e muitas micro-flores brancas

Ao final, constato que a degradação da natureza continua por toda a parte, inclusive dentro do Parque Estadual, já esteve pior, mas poderia estar muito melhor e podemos fazer muito pouco para mudar esta realidade.

Rio Jatobá acima da cachoeira, com pouca água e muitas micro-flores brancas

Em julho estaremos de volta para participar da Festança de Vila Bela e tenho que admitir que saio da Vila com o coração pesado, gostaria de ficar muito mais tempo, mas a continuidade de nosso projeto depende exclusivamente da energia e do esforço que fizermos em busca de apoio dos parceiros e amigos.

Texto e Fotos: Mario Friedlander

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Diário de Bordo 05 de junho 2011 - No topo da Cascata dos Namorados


Dia Mundial do Meio Ambiente, pleno domingão em Vila Bela, nenhuma atividade a vista, acordamos bem cedo, arrumamos nosso equipamento e junto com o Divino Vilas Boas, já recuperado vamos a sede do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, situada a cerca de 12 km de Vila Bela.


A sede do Parque é composta de algumas casinhas sem nenhuma arquitetura ambientalmente ou culturalmente relevante, localizam-se na área com maior uso público do Parque, a região da Cascata dos Namorados, da Cascatinha e do Poção onde muita gente de Vila Bela, de Pontes e Lacerda e outras cidades e assentamentos próximos vem tomar banho, fazer churrasco, pescar lambaris, ouvir som alto e descansar junto a natureza.


O volume de água do rio está baixo, mais que o normal para esta época do ano, mas seguimos em frente mesmo assim, subimos uma trilha utilizada por muitos como banheiro e enfrentamos uma subida super íngreme cortando as curvas de nível no meio da mata seca fechada, vamos em busca do topo da Cascata, local pouco visitado pela dificuldade de acesso e pela falta de atrativos, uma vez  que o Poção e a Cascata dos Namorados são lugares de grande beleza , fácil acesso e muito adequados ao uso público para lazer.


Percorremos os 1800 metros de trilha muito ruim até que o último e pior trecho nos leva ao leito rochoso do rio na parte alta da Cascata, o esforço é amplamente recompensado pela vista da área e pelos banhos nas pequenas piscinas naturais com água gelada e muito limpa.


Produzimos fotos bem no topo da Cascata e logo somos recepcionados por um grupo de Araras vermelhas que curiosas, vem conferir o movimento anormal na área.

Apesar do acesso difícil e da pouca visitação, observamos o topo da Cascata todo pichado com tinta azul e branca e algumas cordas amarradas no abismo, coisa de aventureiros irresponsáveis, não encontramos lixo nem sinais perturbadores da presença humana e resolvemos subir o rio para explorar a área.
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A subida se faz no próprio leito rochoso do rio que está com pouca água, as vezes nas grandes lajes de pedras, as vezes pulando e equilibrando-se sobre elas, encontramos duas cachoeirinhas deliciosas e mais acima a o acesso interrompido por uma árvore que caiu, ficamos por ali mesmo e constatamos que a qualidade ambiental e cênica da área ainda é muito boa, pelo menos está grata surpresa para comemorar o dia Mundial do Meio Ambiente.


Tomamos um lanche e um banho revigorante e iniciamos o retorno pela acidentada trilha, ao chegarmos próximos ao Poção, já escutamos o som alto dos carros e o cheiro de fumaça e carne assada, completamos a trilha e vamos embora logo, melhor não estragar a sensação boa que tivemos no alto da Cascata.


Texto e Fotos: Mario Friedlander

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Diário de Bordo - 03 e 04 de junho de 2011 - Mergulho no Paraíso




Depois de um bom tempo viajando por outras estradas, começamos a nos mobilizarmos para retomar os trabalhos de campo do Projeto Paralelo 15. Decidimos visitar o Parque Estadual Serra de Ricardo Franco, localizado no município de Vila Bela da Santíssima Trindade, nos arredores da cidade.

Escolhemos a data da Semana do Meio Ambiente para observarmos a movimentação em torno do tema nas cidades e na mídia e na realidade nua e crua dos Parques mais afastados e que não serão beneficiados pelo efeito da Copa de 2014.

Seguimos para Vila Bela pela estrada que está sendo melhorada e chegamos sem sobressaltos, observamos grossas colunas de fumaça saindo dos campos planos nos arredores do Parque, próximo a fronteira com a Bolívia, sinal de que a expansão dos desmatamentos do cerrado para a conversão em pastagens artificiais para a criação de gado não para nunca. Também reparamos que a indústria madeireira em Pontes e Lacerda está revigorada e os pátios das serrarias estão cheios de toras de árvores de Floresta densa, fico imaginando de onde virá esta madeira, pois restam poucas áreas extensas naturais, as maiores são os minúsculos Parques Estaduais e as áreas indígenas.

Hélio Caldas, Arthur Keunecke e Divino Vila Boas

Estamos em três pessoas na equipe, Eu que escrevo e fotografo, o Hélio Caldas que além de Guia de Turismo, guia o carro, fotografa e faz de tudo um pouco, o Arthur Keunecke Fotógrafo e Guia de Turismo na Chapada dos Guimarães que está conosco em busca de fotografar os Poraquês ou Peixe-elétrico moradores dos poços mais fundos de algumas grande cachoeiras do Parque. Iremos incorporar o morador de Vila Bela e velho conhecido, Divino Vila Boas que trabalha como condutor de visitantes na região de Vila Bela, entre outras coisas.

Depois de organizarmos os equipamentos e fazermos contatos com o pessoal de Vila Bela, iniciamos nossa jornada pela região da Cachoeira do Jatobá, a mais alta do Estado de Mato Grosso com 250 metros de queda livre e uma beleza cênica incomparável, pretendemos subir a Serra pela trilha antiga que sai de uma pequena fazenda na margem esquerda do rio Jatobá, a trilha, bastante fechada e complicada é pouco utilizada, pois subir até a Cachoeira exige horas de caminhada semi-pesada num percurso de exatos 5 km, conforme a medição que fiz com meu GPS.

Cachoeira do Jatobá, na seta branca o Divino Vila Boas serve como referência do incrível tamanho da cachoeira. A foto não mostra toda a cachoeira, boa parte dela encontra-se mergulhada na sombra permanente do cânion.

Iniciamos a caminhada com muito peso pois pretendemos acampar no topo da Cachoeira para podermos explorar um pouco melhor a área, logo nos primeiros 500 metros, o Divino tem um problema de saúde e decidimos rapidamente, abortar a missão, bater em retirada e ir para outro local do Parque. Levamos o Divino de volta a cidade que fica a cerca de 20 km, buscamos os equipamentos de mergulho e de foto subaquática e voltamos rapidamente para enfrentar mais 60 km de estrada de terra, vamos em busca da linda cachoeira do Rio Capivari ou como alguns dizem, a Cachoeira do Paraíso, depois de alguns zigzagues em torno de cercas e de fazendolas de gado, revejo o grandioso Vale do Rio Capivari com toda sua Floresta transformada em pastagens, pelo menos 80 famílias ocupam lotes dentro do Parque Estadual e a cada ano derrubam o pouco que sobrou, entre o Vale do Capivari e o Vale do Rio Paraíso, grande parte das Florestas da subida da Serra já foram derrubadas e fico sabendo que até mesmo no alto da Serra já existem ocupações e desmatamentos. Ficamos perplexos pelo rápido avanço da pecuária e pela brutal destruição das grandes Florestas, dentro do Parque e tudo feito a luz do dia e fotografado pelos satélites.

Cachoeira do Paraíso no rio Capivari

Vamos afogar nossa tristeza e desilusão nas águas límpidas e frias do grande poço da Cachoeira, felizmente não encontramos ninguém fazendo churrasco ou bailes de música sertaneja a todo volume, ou ainda pescarias infames nestes berçários naturais, ficamos nossa equipe rodeada por um lugar espetacular e lixo por toda a parte. Lembramos das estradas e cidades Bolivianas, onde o lixo faz parte da paisagem e constatamos que por aqui é a mesma coisa.

Arthur Keunecke mergulhando no paraíso elétrico

Mergulhamos em busca do Peixe-elétrico e dos cardumes de matrinchãs e piaus e passamos o resto do dia tentando descobrir onde estão os cardumes e porque a água tão cristalina agora está um pouco turva, o Arthur depois de muita procura encontra alguns Poraquês a cerca de 8 metros de profundidade e consegue algumas fotos na escuridão do lago, mas as condições de visibilidade da águas estão longe do ideal e o comportamento curioso do Poraquê, intimida até mesmo mergulhadores experientes como o Hélio e o Arthur, ao contrário dos outros peixes que normalmente se afastam do mergulhador, o Poraquê se aproxima até o limite de contato físico, e ter contato com eles, pode levar ao desfalecimento e morte por afogamento pois a descarga elétrica proveniente deste animal é muito poderosa.

Cardume de Piau

Com o final da tarde, começamos a retornar a Vila Bela e conversamos um pouco como filho do famoso Edmilson Goiano, em cujo "lote" se encontra a Cachoeira, talvez a falta de limpidez da água seja decorrente das grande queimadas que assolaram o Parque no ano passado, as cinzas e pó de carvão acabam indo para a água e diminuem a cristalinidade das águas da região.

Paredão do Parque Estadual Serra de Ricardo Franco

Retornamos rapidamente a Vila Bela, não sem antes apreciar o entardecer nos paredões do Parque Estadual, avistando casais de Araras Vermelhas e Araras Canindés que convivem juntas e grandes árvores chamadas Barrigudas com sua floração rosa forte, quase roxo.

Barriguda Florida

Casal de Araras Canindés

Vestígios da floresta original do Vale do Capivari

Chegamos a Vila Bela a noite, paramos para jantar um PF de peixe no restaurante Beira-rio do Édio e da Hosana e logo ficamos sabendo que o restaurante será desmontado em poucos dias, em seu lugar, será construído um restaurante de alvenaria e uma praça de esportes, a praia será toda aterrada e toda a orla de Vila Bela será revitalizada, pelo menos este é o projeto, espero que ele se concretize e ajude a melhorar a vida dos moradores de Vila Bela, completamente carentes de lazer e de equipamentos e infra estrutura de uso público.

Texto e Fotos: Mario Friedlander